9 dez 2019 - 16h04

Corrupção ainda rouba 5% da riqueza mundial

Operação Lava Jato marca avanço do Brasil no mapa da ética, desde a realização da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção

Sérgio Moro, ministro da Justiça
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, durante seminário para comemorar o Dia Internacional Contra a Corrupção.

Há 16 anos, completados neste dia 9 de dezembro, o México foi a sede da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção. A data marca desde então o Dia Internacional contra a Corrupção. O Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodoc) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) estimam que, por ano, US$ 1 trilhão sejam pagos em subornos e cerca de US$ 2,6 trilhões sejam roubados por meio de corrupção. Ou seja, a corrupção ainda rouba 5% da riqueza mundial (Produto Interno Bruto).

O Brasil foi uma das 102 nações que assinaram a convenção. Em 16 anos, o país acumula avanços no combate à corrupção. Segundo o MPF, só com a Operação Lava Jato, foram recuperados para os cofres públicos, até outubro, mais de R$ 4 bilhões resultantes de acordos de leniência, termos de ajustamento de conduta (TACs) e restituições voluntárias de réus ou condenados.

Um marco importante

“Infelizmente muitas são ainda as empresas que não incorporaram aos seus Códigos de Conduta e Políticas de Integridade (Compliance) os preceitos da Lei Anticorrupção, estendendo tais códigos à adesão de seus fornecedores, prepostos e terceiros, prestadores de serviços de qualquer natureza. Há uma corrida contra o relógio por parte do empresariado que percebeu a urgência de mudar seu comportamento, seu modelo mental, sua atitude e seu grau de tolerância à corrupção, redimensionando riscos reputacionais nos quais queiram incorrer”, observa Gino Oyamada, sócio-diretor da 3G Consultoria, especializada em governança, gestão e gente.  

Para ele, um dos grandes legados da operação Lava Jato é de mostrar que não basta identificar crimes contra o Estado e punir quem os cometa. “É preciso haver uma mudança comportamental, uma maior consciência de todos os membros da sociedade, um resgate da ética.”

Ao longo dos anos os avanços foram importantes. A Constituição Federal de1988 não tem a expressão ‘controle social’ ou a palavra ‘transparência’, que só foram incluídas em uma emenda constitucional de 2012, assinala o economista Gil Castelo Branco, secretário-geral da Agência Contas Abertas, fundada em 2005.

Segundo Castelo Branco, os maiores avanços obtidos pelo país no acompanhamento e controle de gastos públicos foram a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), a Lei Complementar nº 131/2009, que determina a disponibilização de informações em tempo real sobre execução orçamentária e financeira de todas unidades da Federação, e a Lei de Acesso à Informação (LAI).

Maquiagem

Entusiasta do marco legal, Castelo Branco afirma que o sucesso das leis sofre com “maquiagens”, más aplicações ou puro descumprimento. Ele diz que aguarda, há mais de um ano, resposta sobre denúncia documentada (com fotos) que fez por meio da Lei de Acesso à Informação sobre o uso irregular de veículo público de uma autarquia federal.

Segundo o economista, a obrigação de publicar dados de gastos na internet não é plenamente cumprida. De 0 a 10, a nota geral de estados e municípios do Ranking Nacional da Transparência é apenas 5,21. E quanto à Lei de Responsabilidade Fiscal, os tribunais de contas interpretam de maneira diversa os limites e itens de gastos estabelecidos em lei.

O diretor executivo da organização não governamental (ONG) Transparência Brasil, Manoel Galdino, concorda sobre a aplicação volátil da LRF. “Há uma variabilidade muito grande quanto ao que cada tribunal de contas faz”. De acordo com Galdino, a razão das diferenças é a forma como os cargos de conselheiros e ministros são distribuídos. “O problema de fundo mesmo é que os tribunais de contas são politizados. Os tribunais não rejeitam as contas de governadores que indicaram os conselheiros.”

Na opinião do diretor da Transparência Brasil, o acompanhamento dos tribunais é estritamente legalista. “A gente deveria focar em saber se a política pública atingiu o resultado. Melhorou a educação? Melhorou a saúde? Está distribuindo renda? Está promovendo melhorias econômicas? Está reduzindo desigualdade racial? Isso é que a gente tinha que olhar”, ressalta.

“A gente olha só o rito formal, e os tribunais de conta fazem interpretações alternativas para justificar que está dentro da lei. Mas o mais importante, que é saber se melhorou ou não a vida das pessoas, ninguém avalia. Não adianta fazer uma licitação dentro dos conformes para uma política pública que não dá resultado”, afirma Galdino.

Segunda instância

Galdino e Castelo Branco são críticos da decisão do Supremo Tribunal Federal que extinguiu a validade da execução provisória de condenações criminais, mais conhecida como prisão após a segunda instância.

“Não estou entrando no mérito jurídico. Tem que ser cumprido o que a Constituição determina, mas a decisão [a terceira do STF sobre o tema] tem consequência para o combate à corrupção”, destaca Manoel Galdino. “A impunidade é um problema. No Brasil, essa medida beneficia pessoas ricas, poderosas, com dinheiro para pagar advogados caros. É um retrocesso.”

Já Castelo Branco diz que a impossibilidade da prisão após a segunda instância é uma coisa muito grave. “O país volta a ser o paraíso dos corruptos. A Disneylândia dos doleiros, dos empresários desonestos. Todos sabem que, com um bom advogado e recursos, o corrupto consegue protelar as acusações até prescreverem. O corrupto é um apostador. Ele mede riscos e, na medida que percebe que o ganho é grande e o risco é pequeno, ele tende a voltar a corromper.”

Imprensa livre

Os dois especialistas também fazem coro quanto à necessidade de a sociedade acompanhar a aplicação dos tributos que paga e o funcionamento da administração pública. “A sociedade precisa acreditar que pode muito mais do que imagina. Precisa entender que estejam no Executivo, no Legislativo ou no Judiciário, as pessoas que ocupam os poderes, eleitas, concursadas ou comissionadas, são nossos empregados, são nossos representantes”, enfatiza Castelo Branco.

“Não existe possibilidade de ter um combate à corrupção efetivo sem uma sociedade informada. Isso passa pela imprensa livre, com capacidade e estrutura para questionar o poder público e questionar”, acrescenta Galdino. “O controle social é fundamental para o combate à corrupção. Sem uma sociedade civil efetiva, com acesso à informação e uma imprensa livre, que fiscaliza e monitora o que todos poderes públicos fazem.”

Para Castelo Branco, a imprensa livre é fundamental para ajudar a denunciar, apurar os fatos com responsabilidade. “Isso tem que ser encarado como algo absolutamente normal. A favor tem o press release (comunicado de imprensa) ou a campanha publicitária contratada”.

Talk Assessoria de Comunicação

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